quarta-feira, 11 de novembro de 2015

Um olhar sobre o preconceito: primeira parte

1-    Gordofobia: não finja que não sabe

         Muito tem se falado, principalmente na mídia e nas redes sociais, acerca da problemática da discriminação das “minorias”, de grupos de pessoas que, por um motivo ou outro, são alvo de intolerância, desrespeito e da violência nas suas mais variadas formas, seja verbal, emocional ou física.
          Normalmente, se observarmos essa questão dos abusos discriminatórios, veremos que estes, via de regra, são articulados por pessoas que acreditam estar inseridas em um padrão de “normalidade”, se julgam privilegiadas por pertencerem a determinado círculo social: brancos, heterossexuais, boa condição econômica e... magros. Ao que parece, esse é o modelo de “perfeição” exaustivamente vendido pela mídia, sobretudo, pela televisão e revistas. (Veja que não é prudente generalizar. Uma vez que, nem todo branco, de boa aparência e rico seja um mau sujeito. Não é esse o ponto).
           Mas por que o levantamento dessa questão da pessoa magra? Porque muito se ouve falar em homofobia, racismo e até na discriminação em função de crença - precipuamente enfrentada pelos cultos afro-brasileiros - no entanto, em uma escala muito menor e mais, digamos, localizada, se escuta falar sobre a chamada “gordofobia”.
           De pronto, podemos lançar à luz uma hipótese para que assim seja tratada a intolerância em função do peso: a culpa exclusiva da pessoa por sua condição enquanto gorda. Ou seja, se está assim é porque quer, porque é relaxado, preguiçoso, não se cuida ou não tem força de vontade. Portanto, não é difícil de imaginar o porquê do movimento gordo não ter tanta atenção da mídia e, estar restrito mais entre blogueiras, grupos de ajuda nas redes sociais e fora dela, entre outros militantes da causa plus size. Muito embora, não se precise ir longe para ouvirmos relatos de discriminação: uns mais discretos, outros nem tanto.
          Podemos observar (e não, isso não é errado) heterossexuais se unindo pela causa gay, brancos defendendo negros, espíritas pregando tolerância aos umbandistas... Mas, o quanto difícil é ver um magro apoiando um gordinho? Usa-se, para tanto, o argumento da falta de saúde do corpo gordo. Em uma tentativa falha de justificar a falta de apoio, como se todos os doentes de mundo fossem obesos. De quem é a culpa pelo metabolismo diferenciado do gordo? O que é mais saudável? Comer uma pizza ou devorar três maços de cigarro por dia? Comer meia dúzia de brigadeiros em uma tarde chuvosa ou beber duas garrafas de cachaça ali na esquina?
        Na verdade, não se sabe ao certo. Não estamos inseridos na rotina e nem nos corpos uns dos outros para termos uma real noção de como vai a saúde alheia. O que sabemos é da aparência, e essa, muitas vezes, engana. Gordos nem sempre são sedentários. E magros nem sempre são ativos. O peso sim é uma questão de número. Já a saúde não. Há magros no auge de suas pontes de safena, que nunca fumaram ou beberam álcool na vida. Há gordos nas academias simplesmente porque gostam de malhar. Gordura e saúde não se excluem, automaticamente, entre si. Logo, isso não pode ser argumento para ratificar a intolerância, tampouco para fingir que a gordofobia não existe.
        O apoio da comunidade em geral seria sim de grande ajuda, como foi com o movimento gay e negro, por exemplo. Em verdade, o ideal seria o desenvolvimento de um movimento global por TOLERÂNCIA e RESPEITO com o próximo, seja ele quem for. Mas isso ainda parece utópico.
          De outra banda, cumpre destacar a questão da autoestima dessas pessoas. Como se não bastasse o bombardeio midiático, dia após dias, em um lembrar constante de que os seus corpos não são aceitáveis em um mundo onde a magreza é glamourizada nas passarelas, nos outdoors, no horário nobre da TV aberta, há o enfrentamento constante, também, das ocasiões onde o preconceito impera. Um olhar atravessado daqui, uma piadinha dali, um risinho debochado. Muitas situações no cotidiano não facilitam as vivências de quem é obeso.
          Há pessoas que, mesmo na fase adulta, não conseguem lidar com esse tipo de dificuldade. Acabam por se fechar para o mundo externo, criando uma espécie de casulo protetor e ficando cada vez mais reclusas. Um parêntese: nem vamos aqui entrar no mérito da obesidade na adolescência, que é uma fase reconhecidamente complicada, onde tudo é mico, é feio e onde se busca uma aceitação social constante.
               Na contramão disso tudo, um grupo de pessoas se uniu para buscar o respeito e a elevação da autoestima gorda, celebrando seus corpos grandes e suas formas generosas. Disseminado por grandes bloggers, americanas e europeias, ativistas do chamado “Fat Pride”, esse movimento parece que veio para ficar, (apesar de não haver divulgação maciça) inclusive no Brasil, onde já conta com diversos nomes de peso no enfrentamento da gordofobia, páginas espalhadas pelas redes sociais, grupos, encontros, eventos de grande porte, entre outros, todos voltados para que a pessoa gorda possa exaltar o seu corpo, como qualquer outra pessoa.
             Sim, esse é um aspecto muito positivo e que eleva a autoestima do movimento como um todo. Mas, devemos refletir a seguinte questão: e se essa mensagem de positividade, não atingiu aquela pessoa lá, que está reclusa por ter sofrido bullying, por ter sido motivo de chacota? Se aquela pessoa, não é tão bem resolvida quanto as outras, que participam do movimento, e tem dúvidas quanto à sua imagem, e não se aceita e não se gosta enquanto gorda? É justo que ela sofra por causa da ignorância de alguns em não aceitar algo que sequer lhes diz respeito? É certo propagar o ódio a determinado tipo de pessoa, apenas porque ela não está dentro de uma suposta maioria social?
          Só há uma resposta: NUNCA, em tempo algum o desrespeito e a intolerância qualquer que sejam, deve vigorar! Só é bom para um quando é para TODOS! Gays, gordos, negros, judeus, altos, magros, narigudos, carecas, tatuados, ruivos, pobres, asiáticos...
Todos merecem R E S P E I T O ! ! !
              Precisamos entender que cada um é único à sua maneira, devendo haver igualdade de direitos; PADRONIZAÇÃO humana e social NÃO.
             Fechar os olhos para essa situação, estimular nossas crianças com risos e deboches, a desde cedo fazer piada de gordo, a ver o corpo maior como uma diferença negativa, como um sinal de inferioridade, em nada vai contribuir para uma sociedade mais justa. Associar sempre uma pessoa obesa a algo que é feio, desleixado e sem saúde é reduzir drasticamente a complexidade do ser humano que ali está. É padronizar seus sonhos e aspirações, seus sentimentos e pensamentos. É coisificar a alma humana. E muito se perde com isso. TODOS perdem com isso, só apenas não sabem, em um primeiro momento.
          Por fim, cabe ao final dessa primeira parte uma última reflexão. É válido atentarmos para o fato de que essas pessoas não tem obrigação, por assim dizer, de “permanecerem gordas”. Não é o que se está aqui a dizer, muito pelo contrário.

        A questão gira em torno do direito que cada um tem de perder peso quando quiser e se quiser e não por mera imposição social. Não se prega uma apologia a obesidade, tampouco. Mas sim, à liberdade que cada um tem de manejar a sua vida e seu corpo como bem entender e na hora que lhe achar conveniente, sem que tenha que lhe ver, a cada instante, apontado o dedo inflexível do julgamento alheio. “Perca peso pela saúde, mas não para seguir um padrão imposto. Perca peso se é, realmente, a SUA vontade; mas não porque a revista ou a TV dizem que você tem que ser magra.” É isso, basicamente.

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